Em 4 de setembro de 1970, o Chile elegeu Salvador Allende como seu novo presidente, um marco histórico que o tornou o primeiro líder marxista a ser democraticamente eleito em uma nação latino-americana. Liderando a coalizão de esquerda Unidade Popular, Allende propôs um ambicioso programa de governo que visava nacionalizar os principais setores da economia chilena, como a mineração de cobre, os bancos e a energia, além de promover uma profunda reforma agrária. Contudo, sua vitória foi apertada, com apenas 36% dos votos, o que desde o início sinalizou um cenário de forte oposição política.
A Trajetória de Salvador Allende e a Unidade Popular

Apesar da falta de maioria no Congresso, Allende avançou com seu projeto de transição pacífica para o socialismo. Durante o primeiro ano de seu mandato, ele conseguiu estatizar diversas empresas e aprofundar a reforma agrária, além de frear temporariamente a crise econômica que assolava o país. Contudo, essas medidas logo geraram uma intensa reação da oposição, composta por partidos de direita, grandes conglomerados econômicos e setores da classe média, que temiam a radicalização do governo. A polarização política se intensificou, criando um ambiente de instabilidade e confronto.
A Conspiração e o Envolvimento Externo no Golpe

A crescente tensão no Chile não passou despercebida no cenário internacional. O governo dos Estados Unidos, sob a presidência de Richard Nixon, via com grande preocupação a consolidação de um governo socialista na América Latina. Documentos desclassificados anos depois revelaram que a administração Nixon, com o auxílio da CIA, desempenhou um papel ativo na desestabilização do governo de Allende, financiando a oposição e greves de caminhoneiros que paralisaram o país. O objetivo era claro: criar as condições ideais para um golpe militar.
Internamente, a oposição se articulava com as Forças Armadas. Após uma primeira tentativa de golpe fracassada, conhecida como “Tanquetazo“, em junho de 1973, os conspiradores se reorganizaram. O general Augusto Pinochet, que até então era visto como um legalista e aliado de Allende, emergiu como a figura central da articulação golpista. Diante da pressão insustentável, Allende anunciou em 10 de setembro que convocaria um plebiscito para que a população decidisse sobre sua permanência no poder. A consulta popular, no entanto, nunca aconteceria.
O Bombardeio do Palácio de La Moneda e a Morte de Allende

Na manhã de 11 de setembro de 1973, as Forças Armadas chilenas, lideradas por Pinochet, deram início ao golpe de Estado. O Palácio de La Moneda, sede da presidência, foi cercado por tanques, enquanto aviões da Força Aérea sobrevoavam Santiago. Allende foi instado a se render e aceitar uma oferta de exílio, mas recusou veementemente. Em seu último e emocionante discurso, transmitido pela Rádio Magallanes, ele se despediu do povo chileno, reafirmando sua lealdade à nação e seu sacrifício pela democracia.
Pouco depois, os caças Hawker Hunter iniciaram o bombardeio ao palácio, que foi consumido por chamas e fumaça. As tropas de Pinochet invadiram o prédio e, em meio ao caos, Salvador Allende foi encontrado morto. A versão oficial, confirmada por uma autópsia em 2011, é de que ele cometeu suicídio com um fuzil AK-47 que lhe fora presenteado por Fidel Castro. Sua morte selou o fim da democracia chilena e o início de uma das mais brutais ditaduras da história da América Latina.
O Legado de Allende e a Sombra da Ditadura

O golpe de 1973 mergulhou o Chile em um período de 17 anos de ditadura militar sob o comando de Augusto Pinochet. O regime foi marcado por uma repressão violenta, com milhares de pessoas sendo presas, torturadas, assassinadas ou forçadas ao exílio. Partidos políticos foram banidos, a liberdade de imprensa foi cerceada e os direitos humanos foram sistematicamente violados. O Estádio Nacional de Santiago, por exemplo, foi transformado em um centro de detenção e tortura.
Apesar da brutalidade do regime, a figura de Salvador Allende se tornou um símbolo de resistência democrática e luta por justiça social em todo o mundo. Seu último discurso ecoa até hoje como um testamento de sua coragem e de seu compromisso com o povo. A transição para a democracia no Chile só ocorreria em 1990, mas as feridas abertas pelo golpe de 1973 e pela ditadura de Pinochet continuam a marcar profundamente a sociedade chilena.
